As lojas de departamento, que durante décadas simbolizaram o consumo de massa e a centralização da oferta em um único espaço, vivem um processo de reinvenção. Pressionadas pela digitalização, pela ascensão do e-commerce e pela mudança de comportamento dos consumidores, essas redes buscam reposicionar seu papel no varejo global. O desafio vai além de vender produtos: é preciso oferecer experiências, serviços e curadoria para continuar relevante.
Esse movimento foi o foco do painel “Tariff effect: adaptando as estratégias do varejo em um cenário de mudança”, realizado durante o Latam Retail Show – NRF Europe. O debate conectou o palco do evento no Brasil, com a participação de Marcos Gouvêa, diretor-geral do Gouvêa Ecosystem; e Fábio Adegas Faccio, CEO da Lojas Renner, ao palco da NRF Europa, na França, onde estavam Selvane Mohandas du Menil, diretor-geral da International Association of Department Stores (IADS); Marcello Zanfi, chefe de Locação de Varejo da CBRE Italy; e Mônica Cannalire.
Para Mohandas a transformação das lojas de departamento é parte de uma mudança maior no varejo: de espaços centrados no produto para hubs de experiência, serviço e curadoria, em sintonia com os novos valores do consumidor contemporâneo.
“A questão é que a reinvenção está no cerne das lojas de departamento. É isso que elas têm feito nos últimos 200 anos. Algumas tiveram sucesso e outras, fecharam. Algumas estão se reinventando e indo além de uma simples loja de departamentos”, diz.
Como exemplos, ele citou a Selfridges, em Londres, que abriu há alguns anos uma pista de skate e um cinema, e a Breton, em Nova York, com uma estrutura pensada para ser, primeiro, focada em hospitalidade, alimentos, bebidas e entretenimento, e depois, varejo.
Mohandas destaca que há uma série de lojas de departamento que estão se reinventando porque não querem mais ser chamadas de lojas de departamento, como a Boiler, em Istambul, ou a Falabella, no Chile, Peru, Colômbia.
“Elas constroem essa abordagem em quatro pilares: primeiro, eles possuem dados e sabem tudo sobre os clientes. Em segundo lugar, têm uma nova abordagem para categorias. E terceiro, são muito bons em engajar a comunidade. O Boiler, por exemplo, tem um fim de semana de shows, ginástica e atividades esportivas no ar. E sabe de uma coisa? Eles não vendem nada. É apenas para criar engajamento e fomentar uma comunidade”, explica.
Segundo Mohandas, os três pontos-chave para reinventar uma loja de departamentos são:
- Certifique-se de que você combinará sua receita de varejo com um fluxo de receita estável, como aluguéis e preços.
- Certifique-se de que esse fluxo de receita seja produzido por parceiros interessantes e relevantes que estejam atraindo os clientes certos, o tráfego certo e o público certo.
- Certifique-se de que suas atividades de varejo sejam refletidas em seus ativos digitais para que você ainda possa se maximizar e se manter em todos os níveis.
Transformação
No Brasil, a trajetória da Renner começou há seis décadas como uma tradicional loja de departamento. a companhia direcionou sua atuação para moda e lifestyle, ampliando sua presença com diferentes unidades de negócios. Além da marca principal, o grupo reúne operações como a Camicado, especializada em casa e decoração, a Youcom, voltada ao público jovem, a Ashua, dedicada ao segmento plus size, a Repassa, focada em second hand, e a Realize, instituição financeira que oferece crédito aos clientes.
Atualmente, o grupo soma cerca de 690 lojas distribuídas pelo Brasil, Argentina e Uruguai. “Temos cerca de 690 lojas. Então, nossa capilaridade no país é realmente enorme. Estamos próximos da maioria dos nossos consumidores. E continuamos expandindo porque, para a conveniência deles, principalmente na moda, é muito importante ter uma loja por perto”, diz Faccio.
Segundo ele, o braço financeiro tem papel estratégico na fidelização: os clientes que utilizam a Realize respondem por 30% da receita da Renner e são considerados os mais fiéis ao ecossistema da marca.
Além das vendas
Para Zanfi, abrir uma loja física vai muito além das vendas imediatas. “Cada unidade influencia o comércio ao redor e também o e-commerce. Fechar uma loja pode afetar a reputação da marca e sua participação de mercado, impactando vendas fora da loja”, afirmou.
Ele destacou ainda a relevância das novas métricas em ambientes omnicanal, como frequência de visitas, tempo de permanência, taxa de conversão da equipe, eficiência do merchandising e valor médio da cesta. “Entender o comportamento do cliente hoje é tão importante quanto acompanhar o faturamento”, diz Zanfi.
Outro ponto levantado foi a transformação dos próprios espaços de varejo. Proprietários de shoppings e centros comerciais passaram a adotar usos alternativos para áreas vagas, como coworkings, serviços de saúde, bem-estar e até residências.
Imagem: Divulgação




