Entre a pressa e a presença

Por que o tempo virou o ativo mais simbólico (e estratégico) do varejo

Vivemos a era da atenção dividida. O digital nos promete tudo — rápido, personalizado, sem fricção. Mas a promessa da velocidade esbarra num limite invisível: o cansaço. A sensação de que não temos tempo suficiente para nada é quase unânime. Segundo o estudo “Tendências de Comportamento do Brasileiro 2025”, da Globo e da Oxygen, 72% dos brasileiros relatam essa insuficiência. A multiplicidade de estímulos, paradoxalmente, tem nos esvaziado.

Mas nem todo tempo é o mesmo tempo. Para algumas pessoas, estar numa loja é uma escolha. Para outras, é o único lugar onde se sentem vistas. Em regiões onde o espaço público é precário e a presença digital é fragmentada, o varejo físico cumpre um papel que vai além da conversão: é espaço de refúgio, de pertencimento e de afeto. Às vezes, o tempo ali não é para consumir, é para estar.

Efemeridade como estratégia

Em um mundo em que tudo é urgente, o que é escasso se torna valioso. E isso vale para o tempo — e para o espaço. O crescimento das lojas efêmeras não é só uma estratégia de marketing; é um discurso sobre urgência e pertencimento. Marcas que surgem por uma semana em um endereço escondido ativam um desejo imediato, mas também propõem um ritual: estar ali, naquele instante, é um privilégio. Quem entra sabe que não vai durar.

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Mais do que um canal de vendas, essas lojas são manifestações físicas de um tempo simbólico. São como capítulos de uma história viva — e, muitas vezes, improvisada. A montagem é rápida. A comunicação é direta. A presença é intensa.

O tempo como experiência, não como velocidade

Essa ideia é defendida por especialistas como Lee Peterson, da WD Partners. Para ele, a loja deve “vender sem parecer que está vendendo”. Ou seja: criar um ambiente tão coerente com os valores da marca que a experiência de estar ali já basta.

Essa visão se alinha à ideia de que físico e digital não competem — coexistem. Cada um responde a um tipo de necessidade, a um ritmo de vida. Há momentos em que queremos a agilidade de um clique. Em outros, desejamos o tempo de um café, de uma conversa, de uma descoberta tátil. Tratá-los como complementares, e não como opostos, pode ser o grande salto do varejo contemporâneo.

Não por acaso, estudos sobre atenção sustentada mostram que ambientes com estímulos intencionais prolongam o engajamento cognitivo. E, no varejo, atenção é moeda. Ambientes fisicamente bem projetados, com fluxos organizados e atmosferas coerentes, podem não só sustentar a atenção por mais tempo, como também reforçar o papel do design como elemento estratégico na criação de experiências imersivas.

Nesse contexto, o design deixa de ser apenas visual. Ele organiza fluxos, regula estímulos, desenha atmosferas. Em vez de conduzir o cliente direto ao caixa, ele o convida a desacelerar. A loja vira um lugar para sentir, não só para comprar.

Entre a pressa e a presença
Curva comparativa de atenção sustentada em ambientes físicos estimulantes x não estimulantes. O gráfico revela que a permanência em espaços fisicamente bem projetados pode sustentar a atenção por mais tempo, o que reforça o papel do design como elemento estratégico na criação de experiências imersivas.

Tempo também se projeta

Projetar um espaço comercial é, portanto, também projetar uma relação com o tempo. É decidir se o cliente será conduzido rapidamente ou se poderá explorar, tocar, experimentar. É desenhar não apenas onde ele vai, mas quanto tempo ele fica — e como diferentes personas vivem esse tempo: os que passam correndo, os que vagam sem pressa, os que observam em silêncio. O tempo, nesse sentido, é parte da jornada — e da estratégia.

O tempo pode ser escasso. Pode ser generoso. Pode ser invisível. Mas, em qualquer caso, ele comunica.

Ao sustentar a atenção por mais tempo, o design não apenas gera encantamento — ele gera resultado: impacta em conversão, aumenta o ticket médio, fortalece vínculos.

Em um cenário em que o tempo virou luxo, o design não é ornamento. É core business.

O varejo que entender isso primeiro vai parar de correr atrás do tempo — e começar a fazer com que o tempo corra a seu favor.

Renato Fregnani é fundador da Freg Design e presidente do Retail Design Institute Brasil.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagens: Envato e Reprodução

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