A lição da Golden Goose: como o reparo virou símbolo de autenticidade

Quando viajamos, nossos sentidos ficam mais aguçados e ligados ao que há de novidade e ao que acontece no nosso entorno. Ficamos naturalmente atentos, prestando atenção aos detalhes de cada esquina. Esse é um exercício de aprendizado riquíssimo, que sempre coloco em prática, e não foi diferente em uma recente viagem a Florença, na Itália. Nas minhas andanças, cruzei com uma loja da Golden Goose. Apesar de existir há 20 anos, era  uma marca nova para mim. Me impressionei quando entrei pela primeira vez sua loja, cheia de personalidade e propósito em cada detalhe, e que serve de inspiração para muitos negócios.

Encontrei uma loja com uma narrativa poderosa: criar um espaço onde o cliente é coautor da experiência. Pode parecer um conceito batido, mas sua execução é primorosa. Esta não é uma loja simples da Golden Goose. Dei sorte de entrar numa foward store (uma co-action store), uma flagship onde a marca estruturou ateliers, para cada cliente personalizar seu produto ou até levar seu tênis antigo para reparo.

Já visitei diferentes operações de varejo com propostas de serviços de personalização, como a Levi’s, Uniqlo, Converse, e aqui no Brasil, a Reserva e tantas outras. Porém, o que me chamou atenção é que neste caso, esses serviços reforçam seu real posicionamento baseado em coautoria, reparo e ressignificação.

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Pesquisando sobre a foward store a marca mostra que a loja foi concebida como uma “ambição de alongar o ciclo de vida dos produtos, dando-lhes uma nova vida. Esse conceito gira em torno de quatro pilares: repair, remake, resell, and recycle – repare, refaça, revenda, recicle (em tradução livre)”, colocando a Golden Goose como referência de sustentabilidade emocional e ambiental.

Na área calzoleria (sapateiro), encontrei uma pilha de tênis em um armário antigo, um espaço dedicado ao reparo, personalização e conserto, com todas as máquinas e ferramentas necessárias.

Mais ao fundo, a satoria (atelier), com foco no lifestyle da Golden Goose: bordados, costuras, personalizações exclusivas. O estilo vintage do atelier, com máquinas de costura e bordado, é reinterpretado de forma moderna, conectando passado, presente e futuro. Em vez da perfeição imaculada, ela celebra a imperfeição autêntica, com tênis com aparência usada, couro desgastado e detalhes únicos. Uma provocação que virou assinatura. Um detalhe me chamou a atenção no uniforme dos profissionais que realizavam os serviços dream maker: você sonha, e eles realizam.

E ainda uma mesa com todo tipo de ornamentos: botões, patches, pins, fitas, em diferentes tecidos, formatos e cores. É ali que os clientes podem co-criar suas peças ou construir do zero, refletindo seu estilo único. Qualquer pessoa pode trazer produtos de qualquer marca para lavagem, sanitização, consertos, restauração e recondicionamento, estendendo o ciclo de vida dos produtos e reduzindo impacto.

A Golden Goose é uma marca de luxo e os valores de seus produtos refletem esse posicionamento: um par de tênis custa entre € 500 e € 700, e edições limitadas ultrapassam facilmente os € 1.000. Aqui no Brasil, a marca tem quatro lojas, sendo duas em São Paulo, uma no Rio e outra em Curitiba. Seus pares de tênis giram acima de R$ 4.000. Mais do que preço, o que se paga aqui é pertencimento, autenticidade e a chance de co-criar.

O que a Golden Goose nos mostra é que o luxo verdadeiro não está em acumular mais, mas em dar mais sentido ao que já existe. Ao transformar a loja em um espaço de coautoria, reparo e ressignificação, a marca nos lembra que posicionamento não é discurso: é prática cotidiana, visível em cada detalhe da operação.

Esse olhar que vai além da moda, se transforma em uma lição aplicável a qualquer negócio: valor nasce quando conseguimos conectar produto, propósito e experiência em uma mesma narrativa autêntica. É nesse ponto que marcas deixam de ser apenas fornecedoras de bens e passam a ocupar um lugar afetivo e relevante na vida das pessoas.

Aprender com a Golden Goose é reconhecer que a reinvenção não precisa vir apenas do novo, mas do cuidado, da personalização e da coragem de sustentar uma identidade única em meio à padronização do mercado.

Alexandre van Beeck é diretor de Operações de Retail Media da ConvertaAds.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Reprodução/Divulgação

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