Nos últimos anos, temos acompanhado uma expansão acelerada do uso de Inteligência Artificial (IA) em praticamente todos os setores da economia. Do atendimento ao consumidor à indústria, passando pela saúde, pela educação e até pela criação de conteúdos, o impacto é inegável. Mas há um efeito colateral pouco visível nesse processo, que precisa entrar de forma mais clara no debate público: o peso ambiental dessa transformação.
Um estudo recente da Brasscom revelou que, em cinco anos, os data centers no Brasil devem consumir tanta energia quanto a cidade de São Paulo inteira consome hoje. Em 2024, o setor já gastava 11,3 TWh de eletricidade. A previsão é que esse número salte para 27 TWh em 2029. Para se ter uma ideia do que isso significa, trata-se de uma curva de crescimento muito mais acelerada do que a de indústrias tradicionais, que também demandam grande quantidade de recursos energéticos, mas cuja expansão é mais gradual.
O consumo de água também é um ponto relevante. Cada megawatt instalado exige cerca de 23 mil litros de água para resfriamento. É verdade que, em termos proporcionais, esse volume ainda representa uma fatia pequena diante de setores como a agricultura irrigada ou mesmo o abastecimento humano. Ainda assim, o ritmo de crescimento é tão acelerado que não pode ser ignorado. A questão não é apenas o número absoluto de litros consumidos, mas a tendência de escalada que acompanha a adoção em massa de tecnologias de IA.
É comum ouvir o argumento de que a eficiência tende a aumentar com o tempo. De fato, há investimentos consideráveis em tecnologias de resfriamento mais inteligentes, em otimização do uso de energia e em fontes renováveis. Essa evolução é bem-vinda e necessária. No entanto, surge a dúvida: será que a eficiência conseguirá acompanhar a voracidade da demanda? A história recente da tecnologia mostra que, muitas vezes, o crescimento do consumo supera, em larga escala, os ganhos de eficiência.
A adoção acelerada de ferramentas de IA promete ganhos imensos de produtividade, competitividade e até de qualidade de vida. Mas esse mesmo movimento coloca à prova a sustentabilidade ambiental do nosso futuro digital. Não se trata de barrar a inovação, mas de repensar o modelo de crescimento para que ele leve em consideração não apenas o retorno econômico, mas também os limites do planeta. Esse equilíbrio não é simples e exige planejamento estratégico, regulação adequada e, principalmente, consciência coletiva.
Vale lembrar que, em outras revoluções industriais, também houve custos invisíveis que só se tornaram claros quando eles já eram grandes demais. A diferença é que, desta vez, temos a oportunidade de aprender com o passado e agir de forma preventiva. Ignorar os sinais pode significar enfrentar, em um futuro próximo, riscos ambientais reais e difíceis de reverter.
Se o futuro digital vai depender cada vez mais de data centers, precisamos encarar a discussão desde já. A pergunta que fica é: qual é o custo invisível da Inteligência Artificial e estamos, de fato, preparados para lidar com ele antes que se torne irreversível?
Caio Camargo é especialista em inovação no varejo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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